terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Falsa Identidade / Falsa Liberdade de Escolha


“A maneira pela qual uma jovem aceita e se desincumbe do date obrigatório, a entoação ao telefone e na mais familiar situação, a escolha das palavras na conversa, e até mesmo a vida interior organizada segundo os conceitos classificatórios da psicologia profunda vulgarizada, tudo isso atesta a tentativa de fazer de si mesmo um aparelho eficiente e que corresponda, mesmo nos mais profundos impulsos instintivos, ao modelo apresentado pela indústria cultural.” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 156)
Os produtos da indústria cultural doutrinam e manipulam a consciência do indivíduo, uma vez que trazem consigo atitudes e hábitos prescritos, certas reacções intelectuais e emocionais que prendem os consumidores mais ou menos agradavelmente aos produtos e, por meio destes, ao todo social. A identificação com as mercadorias adquire uma dimensão quase absoluta na vida dos indivíduos.
O suposto reconhecimento em mercadorias expressa a racionalidade de uma sociedade baseada na aparência. O falso reconhecimento é a expressão de uma pseudo liberdade, pois, independentemente do quanto o indivíduo se encontre na satisfação de necessidades produzidas pela indústria, o que é fortalecido pelas condições da sua existência, esses são produtos de uma sociedade cujo objectivo é o controlo social. É o falso reconhecimento e a pseudo liberdade que impulsionam a indústria cultural.
A indústria cultural, já nos primórdios da época moderna e agora mais intensamente, promove a ilusão de liberdade de escolha, de que vende produtos diferenciados para cada tipo de pessoa, e o indivíduo tem a impressão de que a mercadoria foi produzida tendo em vista a sua própria necessidade. O engano é que, na verdade, são distinções ilusórias que fazem parte da organização e classificação efectuadas pelo “esquematismo” da indústria cultural, cuja função é prover a quantificação e proclamá-la como personificação e diferenciação.
Assim, “gosto” e “livre escolha” são categorias que fazem parte do que Adorno denominou estilização, a qual nada mais é do que um aspecto da estandardização, isto é, a padronização.
Dessa forma, o que está na base da pseudo-individualização é uma suposta diferenciação do indivíduo, tendo em vista a escolha pretensamente “livre” de objectos de consumo, a qual está de antemão estandardizada, padronizada.
A proclamada autonomia do indivíduo revela-se então como indiferenciação, uma vez que os indivíduos não se diferenciam do social, apenas seguem padrões pré-estabelecidos.
“As mais íntimas reacções das pessoas estão tão completamente reificadas para elas próprias que a ideia de algo peculiar a elas só perdura na mais extrema abstração: personality significa para elas pouco mais do que possuir dentes deslumbrantemente brancos e estar livres do suor nas axilas e das emoções. Eis aí o triunfo da publicidade na indústria cultural, a mimese compulsiva dos consumidores, pela qual se identificam às mercadorias culturais que eles, ao mesmo tempo, decifram muito bem.” (HORKHEIMER; ADORNO, 1985, p. 156)
Raquel Guimarães